Exercícios de Futurologia

Henrique Loja

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Exercícios de Futurologia integra o conjunto de exposições que tem vindo a ser apresentado na Galeria Quadrum intitulado “Ciclo Budapeste”, que traz àquele espaço o resultado, direto ou indireto, do trabalho desenvolvido pelos artistas portugueses selecionados para o Programa de Intercâmbio Lisboa-Budapeste.

O projeto apresentado na Galeria Quadrum desenrola-se a partir da experiência de residência artística em Budapeste e do trabalho lá produzido e apresentado pelo artista (Browser, 2015), que reflete sobre as questões em torno do apagamento da História política e social do contexto urbano através da substituição de nomes de arruamentos com algum teor ou insinuação comunista.

Nas sete peças apresentadas nesta exposição, Henrique Loja utiliza como referência um número da revista Science & Vie de 1990, cujo título é La Vie Quotidienne en 2015. Nesta publicação recolhem-se artigos diversos sobre questões tecnológicas e especulações sobre a evolução técnica e respetivas aplicações na vida quotidiana. Havendo uma quase-coincidência da vida do artista com a amplitude temporal a que se refere a revista, no exercício de futurologia, existe uma empatia pessoal com estas questões.

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Há títulos que são indicações, sugestões de caminhos, para que o Corpo se oriente no melhor Sentido. Este, Exercícios de Futurologia, diz-nos absolutamente tudo. Traduz-nos a exposição no melhor que poderia ser um texto crítico sobre si mesma: intitular-se.

E como qualquer tradução (neste caso da obra em texto) mente-nos descaradamente, mas não estamos ainda certos disso: estamos naquela fase

– Talvez exercícios de presentologia seja um termo mais justo – huummmmmmm

– mas nisto do tempo, da não-linha, nunca se sabe:

– o futuro também é agora

(há alguém que conversa em diferido)

Como conversar com o futuro? Com que pensar o futuro?

(o nosso, o do mundo, o do mundo que nos conserva)

Henrique transforma a pergunta, num quase-gesto de recusa: não vamos pensar o futuro, vamos pensar o Agora. Pensá-lo com as conjecturas/projecções que lhe foram atribuídas, mas igualmente com a expectativa do que é e do que aparece, uma visão quase antropológica de relato com gestos também eles apreendidos nas práticas do hoje: sem mestria mas com uma inteligência exacta.

A progressão de acontecimentos por caminhos, transformações, sequências, repetições, … , vão assegurar a nossa continuidade no mundo: grande corpo com memória que nos guarda.

– No futuro, vamos estar lá todos.

O aqui assinalável é o agir (exercitar) de forma a que o mundo mantenha memória no presente e o domínio da capacidade de pensar a uma velocidade real, e em directo, num efeito pseudo televisivo de emissão em directo: a condensação do aqui e do agora – que é futuro – no aqui e no agora – que é futuro. Com o autor na figura de médium treinado, com a capacidade analítica de viver no tempo certo.

(um fantasma de uma conversa sem data)

Uma volta engraçada: especulações sobre o presente com material fruto de futurologia passada sobre o presente. É um exacerbar, uma potência, da própria ideia de especulação ou do próprio presente. Faz uso do lançamento-de-expectativas-para-o-futuro, desporto quase olímpico (pelo menos na exaustão que acarreta) que segue três regras essenciais: localizar-se no presente; dirigir a expectativa para o futuro (direcção espácio-temporal da expectativa); lançar com todo o arcabouço “expectacional”. Ora, o que acontece é que há muitos danos emocionais: aposta-se com muito, gera uma certa ansiedade.

Dominando-a, à ansiedade, Henrique pratica a sua versão free style – variante urbana; mostra-nos os truques com uma despreocupação pelas regras: a versão desprofissionalizada, que se serve do quotidiano (fazendo dele uso), numa exibição de habilidades equilibrada com a superação de objectivos próprios e não hetero impostos.

No hoje, com medidas-informação-recolha do ontem que lançou (e aumentou a sua própria ansiedade por constatação da falha) ao futuro em versão desporto, actua um lançamento elíptico que de uma forma hábil une ontem-hoje-amanhã numa versão futuro-hoje que aniquila a representação de tempo que se coaduna com estes mesmos lançamentos.

Remissão no mundo para um extra mundo – uma espécie de tentativa (exercício) de anti-representação, não apenas como uma referência que se trabalha, mas um transporte para um espaço paralelo onde eventos, encontros e cruzamentos possam acontecer: confirma-se, versão free-style do lançamento-de-expectativas-para-o-futuro.

Então, a exposição que se pensa no próprio título e que ao mesmo tempo nos mente – (poderá ser apenas erro de tradução matéria-palavra:) uma inevitável mentira – é um show free style de lançamento-de-expectativas-para-o-futuro. Concluo-o sinónimo.

– Catarina Real

*Por opção da autora, o texto não foi escrito segundo o Acordo Ortográfico de 1990.

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Publicação

Título
Textos de
Ciclo Budapeste – Henrique Loja
José Marmeleira