– 31.08.2025
As plantas não começam no início. Emergem do meio, do âmago das coisas, nem inteiramente da terra nem plenamente do céu. Entretecem-se através do mundo, enterrando as suas raízes no solo enquanto se estendem em direção à atmosfera, sempre em movimento, sempre em conexão. Convidam-nos a viajar com elas, a seguir os seus percursos no tempo e no espaço.
Formada em Belas Artes no Porto e radicada no Brasil há quinze anos, Flávia Vieira trabalha com escultura, têxteis e cerâmica, numa exploração das histórias culturais do fazer. A sua investigação sobre pigmentos naturais informa o seu conceito de «diásporas botânicas» – o entrelaçamento contínuo da natureza, história e cultura à medida que as sementes migram e as plantas são desenraizadas e replantadas noutros lugares, impactando os seus entornos. Em Pau-Campeche, a artista desenvolve esta ideia por meio de paisagens fílmicas e escultóricas inspiradas na árvore com o mesmo nome.
Aqui, o pau-campeche é simultaneamente testemunha e agente das histórias interligadas do comércio colonial e da expressão artística. O corante negro profundo extraído do cerne da árvore tingia outrora as vestes das elites europeias de uma escuridão resplandecente, transformando o pigmento em poder. Mas a árvore em si foi sempre elusiva – valorizada, extraída, mas nunca totalmente possuída. Símbolo do desejo e da deslocação, ela recorda-nos que as vidas vegetais lançam longas sombras, sussurrando histórias inacabadas e convidando-nos a escutar.
– 31.08.2025