Catálogo da exposição Earthkeeping / Earthshaking – arte, feminismos e ecologia que esteve patente na Galeria Quadrum entre 25 de julho e 4 de outubro de 2020, com curadoria de Vanessa Badagliacca e Giulia Lamoni. Esta edição bilingue (português e inglês) reúne textos de Tobi Maier, Vanessa Badagliacca, Giulia Lamoni, Lucy R. Lippard, Marcello Di Paola, Emilio Tarazona e entrevistas com os artistas Jane Logemann, Janet Culbertson, Merle Temkin, Patricia Johanson, Phyllis Janto, Sabra Moore, Sandy Gellis e Shirley Fuerst. Contém também a reprodução fotográfica das obras expostas e uma peça gráfica de Maura Grimaldi.
“Desde as primeiras vagas do feminismo e da influente obra O Segundo Sexo (1949), de Simone de Beauvoir, as subsequentes ondas feministas têm vindo a lutar contra o domínio do modelo patriarcal, da heteronormatividade e da norma cisgénero, num constante esforço para libertar e legitimar a compreensão das pessoas relativamente aos seus próprios géneros e corpos e o seu poder emancipatório na sociedade. Em tempos de intenso debate sobre as alterações climáticas e as políticas de identidade, as questões que esta exposição coloca sobre arte, feminismos e ecologia não podiam ser mais oportunas.”
-Tobi Maier
“Apesar de todas as obras de arte expostas questionarem, de modos diferentes, problemas ambientais e/ou de género, a heterogeneidade palpável dos seus discursos, tanto estéticos como políticos, reflete, de um ponto de vista metodológico, a articulação das múltiplas vozes que compõem o número treze da revista Heresies. Neste sentido, ao mesmo tempo que este projeto curatorial promove uma avaliação histórica do papel pioneiro das mulheres artistas na exploração das relações entre a prática artística e o pensamento ecológico – um processo mais ou menos contemporâneo da emergência dos discursos ecofeministas –, propõe também interligar esta abordagem, e o arquivo que contribuiu para a moldar, com o presente.”
-Giulia Lamoni & Vanessa Badagliacca
“Passaram muitos anos desde que olhei para Heresies 13, embora em 1980-81 tenha sido um projeto apaixonante. Tinha-me esquecido do empolgante conteúdo e da variedade das suas noventa e seis páginas. Quase quarenta anos passados, parece-me simultaneamente visionária e datada. Visionária porque hoje o clima e o ambiente estão no topo das crises mundiais (até mesmo quando uma pandemia se torna dominante – uma pandemia em parte atribuída à destruição dos habitats naturais; uma pandemia que está, ironicamente, a limpar o ar de cidades que se debatiam com um tráfego crescente). Datada porque, infelizmente, a revolta e esperança que expressa se tornaram demasiado familiares. Hoje, a questão é o que poderão os artistas fazer para trazer a crise climática de volta às primeiras páginas.”
-Lucy R. Lippard
“O feminismo e o ambientalismo têm estado envolvidos numa parceria atribulada há cerca de meio século. Juntos travaram lutas emancipatórias de importância primordial e alcançaram muitos êxitos, aprimorando ferramentas conceptuais e críticas que enriqueceram a topografia da análise social de formas inovadoras e para o benefício de todos. Contudo, ecologicamente falando, a perspetiva global – dos sistemas de sistemas – é certamente mais sombria hoje do que quando essa parceria se iniciou. As escalas e os riscos das alterações e dos desafios ambientais têm vindo constantemente a agravar‑se ao mesmo tempo que o planeta encolheu, acomodando o dobro do número de seres humanos que anteriormente existia. A Terra foi drasticamente transformada por forças e estruturas extrativas impulsionadas pela tecnologia que operam a nível mundial.”
-Marcello Di Paola
“Nos feminismos, na ecologia ou na arte, os problemas a enfrentar (e suas possíveis resoluções) não são intrínsecos a um único dispositivo, autónomo ou individualizado. Pelo contrário, distribuem-se através da descontinuidade ou interação de elementos que constituem estruturas (ou sistemas) e, simultaneamente, provocam neles o desencadear de acontecimentos: causas e efeitos muitas vezes distantes uns dos outros, no tempo e no espaço. São forças de ação transdisciplinar, inclusive difíceis de coordenar, atravessando a multiplicidade e encontrando ligações entre as entidades biogeofísicas ou desde a interseccionalidade.”
-Emilio Tarazona