– 24.11.2019
Sábado e domingo: 10h – 13h e 14h – 18h
A obra de Daniel Blaufuks releva uma peculiar mistura entre (auto)biografia e análise histórica, viagem e registo diarístico, factografia e ficcionalidade, predisposições de uma atitude artística e meditativa sobre as realidades que habitamos e sobre o passado que as afecta, entre o colectivo e individual. Através da anotação de momentos, espaços e objectos da vida quotidiana, frequentemente submetida à articulação entre o valor histórico e o potencial rememorativo da fotografia, o trabalho de Daniel Blaufuks distingue-se também por uma persistente reflexão sobre a natureza e o potencial perceptivo da imagem.
Hoje, nada (resumo de um dia por Cesare Pavese em Oficio de Viver) reúne um conjunto muito diversificado de fotografias e objectos – de várias séries anteriores e algumas obras inéditas – que nos dão a ver lugares, coisas, gestos imobilizados, e imagens que assinalam modos de inventariar e arquivar. Destacam-se os planos fechados e aproximados, à distância de uma mão, de um corpo. Podemos encará-las como imagens vagas, difusas, esquivas, que parecem procurar contornar o seu referente. Ou podemos simplesmente assumi-las como asserções do carácter factício, precário e parcelar da imagem.
Que experiência do real nos suscita cada imagem, quando nada parece acontecer? Como é que a imagem nos olha e nos indexa a um passado? De que modo somos projectados por cada imagem para lá do visível, para lá do representável? Estas são questões frequentemente suscitadas por Daniel Blaufuks, mediante uma prática visual que clama por uma outra atenção, uma outra disponibilidade perceptiva, entre a apreciação estética e a especulação narrativa e temporal, susceptível de nos conduzir para uma rede rizomática de possibilidades de crescimento e de perspectivas sempre adiadas, que parece reflectir o próprio feixe aleatório de possibilidades da imaginação e da rememoração.
Sem obedecer a nenhum fio cronológico ou narrativo, estas obras surgem como peças de uma realidade necessariamente fragmentária, desconexa e centrifuga. Um mundo em suspenso e sem horizonte, onde quase tudo está fora de campo. Neste contexto, torna-se ainda mais evidente a atracção de Daniel Blaufuks pelos domínios do literário e do cinemático enquanto categorias fortemente conectadas com o exercício especulativo e ficcional, com o valor de indeterminação das obras enquanto formas e meios legítimos (e necessários) de representar e interpelar a realidade, reforçando as potencialidades da imagem enquanto signo que veicula o tempo enquanto imersão.
– Sérgio Mah, Curador.
*Por opção expressa do autor, o texto não foi escrito segundo o Acordo Ortográfico de 1990.
– 24.11.2019
Sábado e domingo: 10h – 13h e 14h – 18h