O Estado do Mundo: Museu do Atlântico Sul

Assaf Gruber, Charbel-joseph H. Boutros, Gisela Casimiro e Rodrigo Ribeiro Saturnino (ROD), Jacira da Conceição, Jonathan Monk, Juraci Dórea, Luisa Mota, Marcelino Santos, Márcio Carvalho, Maxim Malhado, Tenzin Phuntsog, Tuti Minervino, obras de coleções de caráter etnográfico, e publicações do filósofo e educador português Agostinho da Silva.

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As Galerias Municipais de Lisboa apresentam no Pavilhão Branco a exposição O Estado do Mundo: Museu do Atlântico Sul. A exposição explora o projeto imaginado pelo filósofo e educador português Agostinho da Silva durante os seus anos de exílio no Brasil: um museu dedicado “à capacidade fraternal de entrelaçamento do diverso” numa ordem pós-independências.

Em exibição, obras de 13 artistas, coleções de caráter etnográfico, e ainda uma diversa documentação sobre processos emancipatórios em nações africanas e publicações que registam o pensamento do filósofo e educador português Agostinho da Silva (1906-1994).Conceitualizado por da Silva em 1965, o “Museu do Atlântico Sul” deveria estar localizado na fortaleza de São Marcelo, em Salvador da Bahia (Brasil), com uma coleção organizada a partir de objetos históricos e etnográficos, e peças artísticas provenientes de todos os países que integrariam o que o pensador português definia como o “Novo Equador”. Nos arquivos do “Centro de Estudos Afro-Orientais” de Salvador da Bahia, encontram-se cartas nas quais Agostinho da Silva solicita objetos (a serem enviados de países africanos, asiáticos e das Américas) que deveriam fazer parte da coleção do museu. No entanto, o “Museu do Atlântico Sul” nunca foi efetivamente construído, permanecendo como uma ideia e possibilidade para novas formas de interação cultural e política. No desejo do seu criador, explicitado nas duas folhas dactilografadas que documentam a criação do museu, a instituição revelaria a “capacidade fraternal de entrelaçamento do diverso”.

O “Museu do Atlântico Sul” integra as ações de Agostinho da Silva (a organização do Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade da Bahia é um outro exemplo) em nome das suas ideias sobre um nascente estado do mundo, no qual uma nova redistribuição de poder tomava forma: “Dizia ele que a principal oposição política de então se dava segundo um eixo leste-oeste e gerava dois hemisférios – o que era óbvio –, mas que isso teria mais ou menos curta duração – o que já não era tão óbvio assim. Sem se fazer ilusões quanto às forças que se opunham e às tendências imperiais de ambas, afirmava que cada vez mais se aproximariam União Soviética, Estados Unidos e ocidente Europeu, com as respectivas áreas de influência mais próxima. E que dessa aproximação resultaria bem provável entente, na qual os mais ricos, industrializados, e, num certo sentido, “brancos”, se uniriam ou pelo menos se entenderiam para explorar os pobres, predominantemente agrícolas e de variegadas “cores”. Nesse momento, a situação giraria noventa graus e a oposição seria norte-sul, com os correlativos hemisférios, impondo aos que ficassem abaixo do novo Equador (mais que geográfico, econômico e sociopolítico) a necessidade de se juntarem em defesa de si mesmos, e das transformações que Agostinho queria ver operadas no mundo.”[1]

Num contexto no qual o passado colonial e os inacabados processos de descolonização integram o debate político e cultural em escala global, o projeto expositivo O Estado do Mundo: Museu do Atlântico Sul toma forma agora em Lisboa como um exercício para imaginação durante as celebrações do bicentenário da independência do Brasil. A exposição se propõe a materializar o museu proposto por Agostinho da Silva, a partir do contexto presente no qual as relações entre Norte e Sul se encontram problematizadas sob o permanente perigo da tentativa de um “retorno à ordem” cultural e política guiada pelas noções de força, hierarquia e valores imutáveis.

Para O Estado do Mundo: Museu do Atlântico Sul toda a luta política cria, também, uma forma estética. Qualquer dissociação entre esses dois agenciamentos se torna efetivamente impossível numa instituição operando em nome da redefinição dos conceitos de centro e espaços periféricos, identidade nacional e reconstrução pós-colonial. Não se trata então de reproduzir o projeto original do museu, o fetichizando, ou depositá-lo numa vitrine expositiva da história, mas abrir as suas portas pensando com Agostinho da Silva as necessidades do tempo presente a partir das intuições iniciais que o impulsionaram a conceber a existência de uma instituição com uma missão tão única quanto urgente: propor uma experiência museológica orientada não para o passado, mas para o futuro e os seus embates.

-Marcelo Rezende, curador

[1] Pedro Agostinho. Revista Afro-Ásia, Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia (1995).

Descarregue aqui a Folha de Sala para Crianças.

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Programa Público

Data
Título
Com/de
Categoria
Local
20221112
12.11.2022
O monumento no campo expandido – Como cuidar de um arquivo que ainda não existe
Márcio Carvalho, Tobi Maier
Visita Guiada
Pavilhão Branco
20221203
03.12.2022
Silêncio e a Voz
Jacira da Conceição
Visita Guiada
Pavilhão Branco

Jornal

Data
Título
Autor
23.09.2022
O Estado do Mundo: Museu do Atlântico Sul
Marcelo Rezende